Estética negra — A arte do empoderamento
Estética negra — A arte do
empoderamento
Entre o
momento que Negra Lu pega o tecido nas mãos e o transforma em arte na cabeça
das clientes, é um mundo. As dobras são feitas com precisão, os olhares dos
transeuntes expressam admiração e atenção a todos os seus gestos. É assim que o
pano, trazido da África e com estampas coloridas, se torna um dos elementos de
representação da estética negra: o turbante.
Para
Negra Lu, o turbante é mais do que um mero objeto estético, pois além de fazer
parte da sua história de vida, com ele, ela se torna uma verdadeira rainha.
“Depois que colocamos o turbante na cabeça, nós compreendemos que aquilo se
tornou uma coroa. O turbante é um complemento da nossa raiz, da nossa
ancestralidade muito mais até que o processo religioso.”
"Turbantar"
a cabeça das mulheres é uma das alegrias de Negra Lu, ela acredita que não
existe poder maior do que ver no olhar de suas clientes quando elas se veem
coroadas.
A poesia tem cor
Estudante
da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Estado da Bahia, Jaison
Santos acredita que o fato de ser um homem negro em um país racista, que nega
educação de qualidade e outras necessidades básicas, faz toda a diferença.
Jaison acredita que o fato de fazer arte, antes de confirmar sua existência
como pessoa negra, aumenta sua força como ser humano.
Em suas
histórias, Jaison não acredita haver distinção entre pessoas de qualquer etnia,
para ele o diferencial é ter o autor negro. “As ilustrações que faço de meus
poemas, quando vejo a necessidade, as figuras humanas tem características de
pessoas afrodescendentes, mestiças”, conta Jaison.
De acordo
o artista, o empoderamento através da arte se dá pelo reconhecimento. “As
pessoas negras são programadas desde a infância a se acharem fracos, feios e
deficientes em vários aspectos. Depois que reconhecem, notam que eram fortes o
tempo todo”, conclui.
A política do empoderamento
Porém,
nem só de cores fortes, turbantes e reconhecimento do cabelo crespo vive a
estética negra. Mais do que um elemento de orgulho e aceitação, ela está em
diversos âmbitos da sociedade. Seja na dança, no teatro, no cinema ou na
fotografia, a estética do povo negro é um tema a ser debatido.
De acordo
com Ivy Gudes, Doutora e Mestre em Educação e Contemporaneidade pela
Universidade do Estado da Bahia (UNEB), docente do curso de Licenciatura em Ed.
Física da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e membro da comissão
da 1ª Marcha do Empoderamento Crespo de Salvador, estética negra é um dos
primeiros indicadores de racismo na sociedade.
Para ela,
a partir do momento em que a pessoa negra reconhece que sua história é
importante para se colocar no mundo e na sociedade, acontece uma desconstrução
de todos os valores de uma sociedade branca racista que determina o espaço para
o negro no Brasil. “Quando essas mulheres e
homens negros identificam os mecanismos do racismo, eles entendem as formas de
lutar contra ele e se empoderam”, explica.
"Empoderamento"
vem do Empowerment, um termo americano usado na década de 50, quando ainda se
pensava a revolução industrial. Para Ivy, as redes sociais têm contribuído para
a luta negra como facilitadora de propor outras formas de fazer política a
partir da estética.
“O
movimento de empoderamento crespo, que surge a partir da 1º Marcha do
Empoderamento Crespo de Salvador, é um movimento político que toma a estética
como vertente de luta. Desde que iniciamos essa construção da primeira marcha,
pensamos a estética como mais um braço de luta antirracista”, conclui.
A visão da arte negra
Desde cedo, Julia Morais, estudante de Bacharelado
Interdisciplinar em Artes, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), conheceu e
se identificou com a sétima arte. Apaixonada pelo audiovisual e prestes a
iniciar um documentário sobre Caruru, a estudante pretende produzir somente o
que a representa. " Seja através dos meus textos, poesias ou, futuramente,
filmes, minha identidade está e estará presente em tudo", conta Julia.
Em seu documentário, Julia e sua equipe pretendem registrar, através de diversos lugares de fala, os processos que vão desde a escolha dos ingredientes, até o preparo e a celebração do caruru como ritual ancestral em Salvador. "Abordaremos também o que envolve, atualmente, a tentativa de extinção dos Carurus de Santo, devido à crescente evangelização do povo preto e da demonização das religiões afro-diaspóricas", explica.
A estudante acredita que o racismo ainda é um empecilho para as criações feitas por pessoas negras. "O racismo continua nos dizendo que não somos capazes de produzir o que quer que seja, que não somos bons o suficiente, não somos importantes. Tudo que produzimos é importante e válido, especialmente se nos posicionarmos contra os ideais da branquitude racista", diz.
Para Julia, seu empoderamento acontece através do reconhecimento em obras tanto cinematográficas, visuais e musicais. "A arte e a estética são algumas das formas que temos de mostrar para o mundo quem somos, o que sentimos e o que queremos. Quanto mais pessoas negras produzindo arte que fale sobre nós, mais representativo e inspirador", afirma.
Em seu documentário, Julia e sua equipe pretendem registrar, através de diversos lugares de fala, os processos que vão desde a escolha dos ingredientes, até o preparo e a celebração do caruru como ritual ancestral em Salvador. "Abordaremos também o que envolve, atualmente, a tentativa de extinção dos Carurus de Santo, devido à crescente evangelização do povo preto e da demonização das religiões afro-diaspóricas", explica.
A estudante acredita que o racismo ainda é um empecilho para as criações feitas por pessoas negras. "O racismo continua nos dizendo que não somos capazes de produzir o que quer que seja, que não somos bons o suficiente, não somos importantes. Tudo que produzimos é importante e válido, especialmente se nos posicionarmos contra os ideais da branquitude racista", diz.
Para Julia, seu empoderamento acontece através do reconhecimento em obras tanto cinematográficas, visuais e musicais. "A arte e a estética são algumas das formas que temos de mostrar para o mundo quem somos, o que sentimos e o que queremos. Quanto mais pessoas negras produzindo arte que fale sobre nós, mais representativo e inspirador", afirma.
Empoderamento negro feminino
A fotografa Jhu Almeida começou a carreira profissional aos
17 anos, foi na mesma época que resolveu aderir ao cabelo crespo, passando pela
transição capilar - o retorno do cabelo a sua textura natural. O motivo da
mudança foi a falta de representação nos meios de comunicação. "Eu senti a
necessidade de retratar a mulher negra e mostrar que belo não é só o padrão
europeu", conta Jhu.
Foi assim que criou o projeto de Empoderamento Negro Feminino, um ensaio só com mulheres negras, exposto na 2 edição do projeto Canto Skol, que aconteceu em setembro de 2016, na quadro do Apaxes do Tororó. O projeto é apenas um dos muitos que Jhu direciona para a temática negra, para ela mais de 90% do seu trabalho é sobre a valorização da estética negra feminina.
"Empoderar-se quer dizer tomar poder sobre si, mas vai muito mais além, vai além de nós, do individual. E faz parte do combo da representatividade e sororidade, é quando nós mulheres acordamos e percebemos que fazemos parte de uma realidade muito maior, é quando nos enxergamos como semelhante, percebemos que não somos rivais, que somos pessoas que vivem uma mesma opressão e que em coletivo podemos ser mais, é alentador sentir que juntas conseguimos muito mais conquistas", conclui.
Dançando na cara da sociedade de
salto alto
Para o
dançarino de estileto, Elivan Nascimento, a dança foi a ferramenta que ele
encontrou para o empoderamento. Morador de uma comunidade marginalizada pela
sociedade, o Nordeste de Amaralina, ele conheceu a arte através de um projeto
de inclusão social na rede pública. O projeto, do Teatro SESI Rio Vemelho, o
fez ter o primeiro contato o teatro, migrar para a dança foi um salta. Elivan
descobriu então que queria viver de dança. “ Eu tive essa concepção muito cedo, assim que eu
entrei no teatro eu me encontrei. Eu disse 'aqui é o meu lutar'. Me reafrimei”,
conta.
O estilo em que
ele se consolidou, estileto, é a dança com salto alto. Para Elivan, por ser
dentro de uma política feminina, a dança é não só a forma como as pessoas
enxergam o gênero, como também a proposta. O artista acredita que nada é
imposto na dança que ele descreve como poesia dançante. “Por usar dreads, estar
de salto dançando e me afirmando como homem negro e gay, fora dos padrões de
beleza da sociedade, enquanto um bailario que dança de salto, o estileto agrega
muito à minha vida”.
O dançarino acredita que a arte é
ilimitada e por isso ele pode ser o que quiser dentro dela. "É para todos.
Ela é vida. Então dentro da arte eu me sinto suficientemente capaz. De todas as
formas eu me sinto capaz e me sinto viável para poder mostrar o quanto eu amo a
minha cor, o quanto eu amo o que minha raça sempre trouxe seja religiosamente
como em outros aspectos. Dentro da arte eu me sinto muito liberto para poder
mostrar a arte que eu defendo enquanto negro", conclui.
*Reportagem produzida para o primeiro Prêmio Pipas de Publicidade, 2016.
Estética negra — A arte do empoderamento
Reviewed by A escritora sonhadora
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11:04
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